No coração da África, havia uma extensa planície. E no
centro dessa planície, erguia-se uma alta e frondosa árvore. Era o baobá.
Um dia, embaixo do sol escaldante do meio-dia africano,
corria pela planície um coelhinho, que, exausto, suado, quando viu o baobá,
correu a abrigar-se à sua sombra. E ali, protegido pela árvore, ele se sentiu
tão bem, tão reconfortado, que olhando para cima não pôde deixar de dizer:
- Que sombra acolhedora e amiga você tem, baobá! Muito
obrigado!
O baobá, que não costumava receber palavras de
agradecimento, ficou tão reconhecido, que fez balançar os seus galhos e
tremular suas folhinhas, como numa dança de alegria.
O coelho, percebendo a reação da árvore, quis aproveitar-se
um pouquinho da situação e disse assim: - É, realmente sua sombra é muito
boa.... Mas e esses seus frutos que eu estou vendo lá em cima? Não me parecem
assim grande coisa...
O baobá, picado no seu amor próprio, caiu na armadilha. E
soltou, lá de cima de seus galhos, um belo e redondo fruto, que rolou pelo
capim, perto do coelhinho. Este, mais do que depressa, farejou o fruto e o
devorou, pois ele era delicioso. Saciado, voltou para a sombra da árvore,
agradecendo:
- Bem, sua sombra é muito boa, seu fruto também é da melhor
qualidade. Mas... e o seu coração, baobá? Será ele doce como seu fruto ou duro
e seco como sua casca?
O baobá, ouvindo aquilo, deixou-se invadir por uma emoção
que há muito tempo não sentia. Mostrar o seu coração? Ah... Como ele queria...
Mas era tão difícil... Por outro lado, o coelhinho havia se mostrado tão terno,
tão amigo... E assim, hesitante, hesitando, o baobá foi lentamente abrindo o
seu tronco. Foi abrindo, abrindo, até formar uma fenda, por onde o coelho pôde
ver, extasiado, um tesouro de moedas, pedras e joias preciosas, um tesouro
magnífico, que o baobá ofereceu a seu amigo. Maravilhado, o coelho pegou
algumas joias e saiu agradecendo:
- Muito obrigado, bela árvore! Jamais vou te esquecer!
E chegando à sua casa, encontrou sua esposa, a coelha, a
quem presenteou com as joias. A coelha, mais do que depressa, enfeitou-se toda
com anéis, colares e braceletes e saiu para se exibir para suas amigas. A primeira
que ela encontrou foi a hiena, que, assaltada pela inveja, quis logo saber onde
ela havia conseguido joias tão faiscantes. A coelha lhe disse que nada sabia,
mas que fosse falar com seu marido. A hiena não perdeu tempo: foi ter com o
coelho, que lhe contou o que havia acontecido.
No dia seguinte, exatamente ao meio-dia, corria a hiena pela
planície e repetia passo a passo tudo o que o coelho lhe havia contado. Foi
deitar-se à sombra do baobá, elogiou-lhe a sombra, pediu-lhe um fruto,
elogiou-lhe o fruto e finalmente pediu para ver-lhe o coração.
O baobá, a quem o coelhinho na véspera havia tornado mais
confiante e mais generoso, dessa vez nem hesitou. Foi abrindo o seu tronco, foi
abrindo, bem devagarinho, saboreando cada minutinho de entrega. Mas a hiena,
impaciente, pulou com suas garras no tronco do baobá, gritando:
- Abra logo esse coração, eu não aguento esperar! Ande! Eu
quero todo esse tesouro para mim, eu quero tudo, entendeu?
O baobá, apavorado, fechou imediatamente o seu tronco,
deixando a hiena de fora a uivar desesperada, sem conseguir pegar nenhuma joia.
E por mais que ela arranhasse a árvore, ela nada conseguiu.
A partir desse dia é que a hiena ganhou o costume de
vasculhar as entranhas dos animais mortos, pensando encontrar ali algum
tesouro. Mal sabe ela que esse tesouro só existe enquanto o coração é vivo e
bate forte.
Quanto ao baobá, nunca mais ele se abriu. A ferida que ele
sofreu é invisível, mas dificilmente curável. O coração dos homens se parece
com o do baobá. Por que ele se abre tão medrosamente quando ele se abre? Por
que às vezes ele nem se abre? De que hiena será que ele se recorda?