quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Carta para meu Sobrinho Itsaac




Campinas, 20 Agosto de 2011.

Caro Itsaac, ou “It”, como carinhosamente nós, os tios, decidimos te chamar. Escrevo estes breves relatos, com esperança de que o cristianismo de sua época não seja mais o da minha, nem o de outrora, mas que seja melhor, que seja mais sincero, mais vivo, mas se não, ouça-me bem e veja através dos meus olhos o que eu vivi.
Nomeio-te juiz agora, para aferir os teores cristãos entre nossos tempos. Acordemos que cada tempo tem sua particularidade, eu entendo, mas não faça como estes que andam perdidos por ai, desculpando os meios com fins, alheios a palavra versus costumes. Absorva os nutrientes do cristianismo de seu tempo, entenda-o. Pois quando estiver lendo isso, se sua mãe seguiu a risca minhas recomendações, terá 18 anos e será o ano de 2029. É daqui alguns anos, pois estamos comemorando seu 1º aniversário hoje.
Escrevo-lhe saudoso, do tempo em que seus pais oravam em nossa casa e podíamos sempre tocar violão, cantar juntos e tomar café. Dizer, eu nem preciso, que você foi uma benção quando nasceu e que mudou nossas vidas velhas e chatas. Eu fico pensando, que se eu e sua tia Paula, já agora temos saudades, quem dirá quando todo esse tempo passar e você não ter mais tempo pra gente, vamos sentir saudade de todo o tempo do mundo que tínhamos quando você era um bebê.
Como agora tenho saudade, do tempo em que eu e seu pai, saíamos pela cidade, nos bares e outros lugares com violão ou guitarra. Tocávamos, pescando vidas do nosso jeito, sem pré-conceito, só o conceito de que o remédio era para o doente não para o que se achava curado, para o perdido, não pro já achado. Fazendo nosso barulho, seu pai erguendo moicano, ás vezes sentados nas praças ou subindo a Rua 13 de Maio, subia toda a galera junta, coturno, camiseta preta, tinha mais bandas que membros no grupo, era o tal de CMF, Christian Metal Force, seus pais se conheceram assim, ambos andavam de skate, seu pai corria até em campeonatos na época.
Sentávamos no saguão da igreja, todos falando da banda que gostava, tocando violão e cantando a música predileta. Vínhamos de lugares distintos, todo mundo estranho, cada um tinha um estilo, uma ideologia, um pensamento, o tipo de som que gostava; as bandas que defendia e as histórias absurdas que conhecia.
Depois subíamos todos, para uma sala, entre os escombros de uma antiga construção, no andar de cima da antiga pastelaria Voga, (como sobreviveu todo esse tempo, pode ser que ela ainda esteja lá em seus dias), próximo a prefeitura, em frente ao colégio Carlos Gomes. Ouvíamos o Késede (líder do CMF) pregar “que underground era quem perdoava; que andar na contra mão do sistema era muito mais profundo do que o que se imaginava...”.
Depois era hora de sentar no Largo das Andorinhas para comer pão com mortadela, nosso banquete particular, embalados a som de um violão de marca popular, esse violão com certeza já tinha sido a sensação na feira hippie, no Centro de Convivência de manhã, onde todo mundo se encontrava e começava a farra, a grande verdade era que nossos Sábados eram tomados por esse eufórico e frenético itinerário, muitos de nós só voltávamos para casa no Domingo à noite.
A verdade é que, depois que o tempo passou, até hoje, todos nós estamos tentando descobrir o que fazer com os nossos Sábados.
Tudo acontecia quando ajoelhávamos para orar, e sobre isso, me lembro bem de dois testemunhos, uma vez uma mina, líder de jovens, foi nos visitar toda cheia de pré-conceitos, por causa talvez de todo o estereótipo já descrito acima, mas quando começamos o culto, quando começamos a orar ela mudou sua opinião, voltou a sua igreja, reuniu os jovens e disse que eles tinham que ser como nós, buscar a Deus com sede, ela disse ter tido uma experiência muito bacana conosco naquele dia, até hoje eu acho, ela deve fazer comercial da gente por ai, outro dia nós tínhamos que terminar o culto porque ia começar a aula de teologia, que inclusive o Késede era professor, e acontecia depois da reunião do CMF, era a oração final, devia durar só um minuto, mas quando abrimos nossos olhos e paramos de chorar e dizer algo para Deus, acho que já havia se passado algumas horas, já estava escuro e os alunos já tinham desistido da aula e ido embora, ninguém conseguia parar de orar, essa era a verdade. Nesse dia ainda tínhamos conosco uma pessoa muito querida, chamada Margarete, seus pais devem se lembrar dos acontecimentos no prédio velho em cima do Voga, perto da prefeitura e da querida mãezona Margarete.
Barbudos, cabeludos, cheio de cruz no pescoço, bermudão, skate, tatoo, alargador e outros adereços, mas todos com a bíblia na mão, isso é o que via quem passasse pela Av. Irmãs Serafina no Centro, aos sábados naqueles dias.
Seu pai deve ter contado as histórias da família. Outrora as vigílias eram somente nos montes, íamos com seu avô e dormíamos literalmente embrulhados em seu paletó, enchíamos os bolsos das blusas (porque usávamos muitas, devido o frio do lugar) das raízes florescentes que brilhavam na alvorada, mas quando acordávamos no outro dia e íamos mostrar pra sua avó, eram só um monte de gravetos secos, quebrados, sem valor. Tamanha era nossa frustração.
Você deve ter ido às escolas bíblicas dominicais com sua mãe, a questão é que em nosso tempo eram muito diferentes, nos anos 80 os professores faziam festas constantemente e eram verdadeiros grandes palhaços no anonimato, se fantasiavam com roupas velhas de seus pais, geralmente os homens de mulheres e as mulheres de homens, nós não os reconhecíamos de tão completas as atuações, os lanches não eram grande coisa, ganhávamos na verdade muitas, mas muitas balas mesmo, (acho que a congregação não tinha uma nutricionista para selecionar o cardápio nessa época), os brindes das gincanas eram simples e as dinâmicas espirituosas, mas nada de superprodução. Aquilo era mágico pra nós, nos envolvia plenamente, Circo de Soleil era piada perto daquilo. Mesmo com a falta de recurso tudo se tornava precioso naquele tempo. Isso sem falar no teatro de fantoches, eu acho que nem existem mais hoje, eram perfeitos, o teor nutritivo das lições contidas nas histórias mantinha-se sempre frescos em nossas mentes, associados aos personagens que ganhavam uma vida e virtuosidade incrível.
A gente sempre jogava bola na frente da igreja, antes e depois da “escolinha”, como chamávamos; você não vai acreditar, mas brigávamos com o irmãos para não pararem o carro na frente do prédio, tudo para não atrapalhar o futebol, quando lembro disso, eu rio muito, assistíamos as aulas suados, e nosso gás não acabava nunca, nem quando íamos embora pra casa.
No final das aulas, seu avô dava carona para toda a molecada, num Opala azul marinho, que nenhum dos seus tios poderá esquecer. Alguns iam no porta malas, cabiam quase todos lá, posso dizer, que por gostarmos muito de uma farra, o porta mala era um lugar disputadíssimo. Às vezes, na verdade, acho mesmo que foi só uma vez, um dos garotos brincando e bagunçando lá trás caiu e saiu correndo e gritando atrás do carro para não perder a carona, rimos muito disso, foi o Eduardo Roque, mais conhecido como “Du rock”. Soube a pouco tempo, que ele não está mais conosco, infelizmente.
Seu avô poderia ser preso por isso nos dias de hoje, na época acredito que ele não se importava muito, aquilo tudo parecia tão maravilhoso e de certa forma inocente, mesmo sendo um absurdo para muitos, não parecia ter problema para nós.
Dormíamos um na casa do outro, sabíamos das histórias de cada família, sabíamos o gosto da comida, sabíamos as especialidades da casa, quando queríamos comer um bom bolo era nos Vicente, uma galinhada nos Soares, um bife nos Silva.
Houve um tempo It que discutiam nas congregações se as mulheres deviam usar saia ou calça, o que era mais ordeiro, etc. Existia o culto da disciplina, que lembrava os membros sobre os costumes e a doutrina. Tudo bem que alguns costumes já mofam agora no meu tempo, quem dirá no seu.
Toda boa congregação tinha um concílio ou assembléia, onde eram decididos todos os casos polêmicos, todos podiam comentar, se expressar, isso parecia algo muito importante para nós, mesmo ainda crianças. 
Tinha as coisas engraçadas das congregações pequenas, sempre tinha um irmão que falava “bença” ao invés de benção e cantava um dos cânticos do Cantor Cristão quando tinha oportunidade, sempre tinha oportunidade também para o grupo de mulheres local, o grupo de senhoras, ou até em muitos lugares, conhecido como o “Círculo de Oração”, elas também eram sempre responsáveis pela intercessão e tinha sempre um culto só para orar.
Os pontos de pregação, não dispondo de muito equipamento, sempre contavam com um experiente sanfoneiro, e para dar ritmo, alguém no pandeiro, essa era a equipe de música. O culto era avivado! Alegre, com bastante júbilo. Os irmãos mais velhos da congregação, os anciões sempre sentavam no fundo ou ficavam na porta, era fácil identificar a voz deles, pois sempre surgia um “Glória a Deus” ou um “Aleluia” ou até um “Só o Senhor é Deus” bem alto durante o culto. Típico também era ouvir “Santo Jeová, Deus de mistério”, Jeová era bastante usado para se referir ao nosso Deus. Um outro irmão olhava os carros, só ouvia, não via o culto, porque estacionamento não tinha, ficavam todos na rua, a frota era adorável, você nem imagina, era Variant, Corcel I, Brasília, Opala, Passat e como não podia faltar, a mais querida, a Belina, mas o modelo antigo.
E tinha sempre um congresso rolando, um monte de gente de outras congregações se encontrando, em uma congregação sede, ou de alguma de nome na região, sempre com alguém famoso no meio evangélico, alguma atração.
A saudação, a Paz do Senhor, era sempre com doçura e com amor, tinha ritmo e uma sonoridade peculiar à época, era uma espécie de supra cumprimento, exigível, identificável, um axioma para qualquer papo, algo que deixaria nossas mentes a vontade para falar sobre qualquer coisa. Nessa época isso não era só cumprimento, era o início de um bom papo.
O batismo era no rio, em nenhum outro lugar, não se abria mão disso.
Um pregador não esqueceria sua gravata, a bíblia e o paletó, seria charmoso se não fosse mistificado, mas depois de tão criticado, esse rótulo de crente acabou caindo.
Seu avô pregava em público, chamava-se culto ao ar livre, o que chamam hoje de show gospel, eloqüente, encontrava-se sempre em uma praça, um pregador aos brados, anunciando as novas do reino.
Eu me lembro que Televisão foi uma questão, tratada com muita atenção, você não deve nem imaginar como seria, em seu tempo sobre isso se fazer, na igreja, uma discussão, não fizeram o mesmo para Internet, o que achei, confesso, uma não-tradição.
O céu, diferente de hoje, era pregado, vivido e anunciado, hoje é um pouco abandonado, por toda a cidade só se ouve falar de um tal de “evangelho da prosperidade”. Se você estivesse aqui hoje faria parte da mocidade, ia cantar no coro com toda disposição e vontade é o que fizeram os nossos amigos, irmãos e irmãs de nossa idade. Na verdade, pessoalmente, eu gostaria de conversar com você sempre sobre a cultura cristã atual, meu querido sobrinho e irmão, coisas que você talvez não tenha ouvido falar, reteté, saia no pé, é... É assim que é, desse jeito, só para lembrar nosso evangelho tupiniquim, gritando Jeová Jireh, dando Glória a Deus alto. Ou não, talvez sobre todas essas coisas você já deva ter ouvido falar e dado risada junto com a gente, infelizmente, um grande escritor já disse, a igreja tem respostas atrasadas para perguntas urgentes, ser mais atual e presente, foi uma meta em nosso tempo e acho que tem que ser eternamente.
Mas fique sossegado, pois os costumes podem ir e vir, como sempre acontece, porem a pura Palavra é a mesma, essa não muda é contemporânea plenamente.
Lhe ofereço minhas memórias It, para saudar outros tempos, com esperança, como uma semente, não ouso ser Drummond, mas tenho começado algumas frases com, antigamente.
Coisa de velho.



Jonatas A. Silva
Em um inverno rigoroso...

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Release SINAPSE, Protesto.

Esses são meus relatos...






Apoiado sobre a Informação, Imaginação e Comprometimento o evento aconteceu, como era objetivo, dentro de nós, quase se podia ouvi ecoar no mais fundo dos corações, de todos que compuseram a Sinapse 2011;
Um grande não para os formatos antigos das instituições.
Um grande não para as congregações que sustentam os relacionamentos com atividades, tarefas e ativismo.
Um grande não para os limites culturais, para os costumes e a comunicação imposta pelas denominações.
Um grande não para a igreja-clube social.
Um grande não para as missas aos domingos, a multidão e a falta de afinidade entre os irmãos.
Um grande não para a falta de sentar junto, comer junto e de cultivo de verdadeiros relacionamentos.
Um grande não para o púlpito que desiguala aqueles a quem Cristo igualou na cruz.
Um grande não para a manutenção massacradora de vidas, das congregações que mais parecem empresas.
 Um grande não para o “reino”, que não é um reino de amigos e família. Um grande não para um “reino” que se perdeu em meio a ativismo, culturas individuais, linguagens próprias, um “reino” quebrado.

Assim demos boas vindas aos novos pensamentos sobre igreja nesse tempo.
E tenho dito sim para esse embrião de novas possibilidades, sonhos de uma igreja mais orgânica para o futuro.
Minha felicidade particular foi sem dúvida, estar ao lado de Livan, Libério, Mateus e Késede no recreio, um privilégio estar ao lado de grandes servos de Deus desse tempo.
Então é isso, Cuidem do jardim de hoje!

Recomendação do Livan, alicerçado sobre Gn. 2.15